Os dentes cerrados bloqueiam a saída extemporânea da cólera visceral que te corrói os incandescentes e dissimulados fígados.
Mas os olhos de cólera não mentem.
Semeias gestos, brilhantes sorrisos de hipócrisia, falseando o existir e o sentir, em busca da vitimização que te traga os afagos mais ingénuos.
Mas os olhos hipócritas não mentem.
Exultas a bondade, a solidariedade, a fraternidade e, na universalidade socialmente aceite, praticas a arte cínica do altruísmo que não se compadece de ninguém que não seja de ti próprio.
Mas os olhos cínicos não mentem.
Acendes a luz por onde passas, não para iluminar o caminho alheio, mas para que ninguém veja quão feio és na escuridão de que és feito.
Mas os olhos sombrios não mentem.
Por essa razão, escondes o olhar e esquivas-te ao choque frontal com os olhares alheios e puros.
É a única forma de esconderes a nebulosa tormenta com que teces a tua alma sangrenta.
© Balthasar Sete-Sóis